sábado, 7 de junho de 2014

Reuniões em casa?


Parecia um conceito que só resultaria nos Estados Unidos.

A verdade é que os portugueses têm tudo menos o hábito de reuniões estruturadas a tempo e horas, com rigor e diretos ao assunto, especialmente quando já existe um elo emocional. Preferimos restaurantes e bares para fechar negócios ou para pensar melhor no funcionamento da empresa onde trabalhamos.

Em casa, não é muito diferente.

Muita coisa se discute à hora da refeição ou ao domingo à tarde, nos intervalos dos programas de Tv.
E que mal tem, se estamos reunidos de igual forma?

Julgo que se não tivesse experimentado, não teria notado a diferença. 

Uma das técnicas fundamentais da Disciplina Positiva são as reuniões de família e obedecem a uma estrutura pré definida.

As reuniões são agendadas todas as semanas ao mesmo dia, à mesma hora, de acordo com a disponibilidade de todos os elementos da família.
Existe uma mesa vazia, um livro de atas, uma agenda ou bloco de notas e dois cargos principais (rotativos): Um Presidente que coordena toda a reunião, e um Secretário que regista e lê a ata, onde todos assinam e dá-se por encerrada a reunião.

Até soa a caso de tribunal, mas existem 2 princípios que tornam estas reuniões únicas e que devem ser assumidos, prontamente, por todos os membros da família:

 Honestidade emocional
Estarmos reunidos para discutir assuntos sérios não quer dizer que não possam existir momentos de humor ou exteriorização de sentimentos. Podem e devem existir. A reunião de família é o lugar ideal para sermos nós próprios e dizer o que pensamos sem nunca corromper a confiança, e buscar respostas ao abrigo de quem nos quer melhor que ninguém.

 Respeito mútuo
Todos assumem um papel decisor de igual importância. Estes encontros não servem para os pais pregarem sermões a filhos, nem para irmãos atirarem culpas. Servem sim, para encontrar soluções que respeitem todos os envolvidos. E é por isso que nenhuma solução deverá ser aplicada sem unanimidade. As crianças (e até os adultos) aceitam melhor os compromissos, quando contribuem no processo e concordam com a decisão final.

E na prática, como acontece?

As reuniões começam por cumprimentos e saudações.
Todos os intervenientes devem encontrar algo de construtivo ou apreciativo para dizer a cada um dos participantes. Esta condição ajuda a confraternizar e a focar nos pontos positivos do outro, tornando o ambiente mais leve e propício à cooperação, em vez da culpabilização e da competição.

Segue-se a ordem de trabalhos.
Primeiro, a avaliação e análise de assuntos anteriores. Segundo, a discussão de assuntos a resolver em conjunto.Todas as ideias são válidas de serem discutidas, e a solução encontrada deve ser experimentada pelo menos durante uma semana antes de se tornar norma.

As crianças com menos de 4 anos poderão ainda não estar aptas para participar ativamente nestas reuniões, mas devem estar presentes e ser-lhes permitido intervir por forma a aumentar o sentimento de pertença.
As intervenções devem ser moderadas pelo presidente que passará a palavra por ordem de pedido. Uma boa dica é utilizar um objeto que valide quem está a falar naquele momento, para que não possa ser interrompido por quem não esteja a segurá-lo. Uma simples caneta, lápis ou cartão colorido é o suficiente para marcar a posição.

É comum que as primeiras reuniões não corram tão bem como o esperado. E também é normal que cada família dê o seu toque pessoal. O importante que não existam fatores de distração sobre a mesa e que o ambiente seja harmonioso e transparente.

A marcação na agenda de pelo menos uma atividade familiar onde todos participem, e a distribuição de tarefas especiais (como limpar a casota do cão, regar as plantas ou colocar o lixo fora) concluem a reunião.
Uma forma de atribuir a responsabilidade destes encargos ou de escolher as atividades, poderá ser tirar à sorte um papelinho com uma das opções escrita de dentro de um pote, ao que podemos chamar, em dose de humor, o pote das surpresas.

Para o desfecho, é indispensável ter previsto uma atividade lúdica, uma sobremesa, ou algo que possa honrar a participação de todos na reunião e que satisfaça todos os gostos.

A agenda deve estar ao alcance de todos e serve para tomar nota de situações que vão surgindo no intervalo das reuniões e que gostaríamos de ver debatidos ou resolvidos.

Por exemplo, Ana é mãe de 3 meninos, com idades entre os 2 e os 10 anos. Todos os dias apanhava as coisas espalhadas pelos filhos, por toda a casa. Ficava aborrecida com aquela situação; por mais que avisasse e arruma-se, a casa continuava desorganizada. Ana estava a perder a esperança e levou o assunto à reunião. Uma das crianças teve uma ideia. Arranjar um caixote onde se colocassem todos os objetos deixados fora do lugar. Com uma regra intransponível, ninguém poderia reaver o seu pertence no espaço de uma semana.
Resultou. Resultou porque todos cumpriram com a regra e para seu espanto, Ana não queria crer na quantidade de coisas que ela própria deixava pelo caminho. E resultou melhor, porque foram as crianças a encontrar a solução.

A verdade é que, na dúvida sobre a eficácia deste tipo de reuniões, experimentei e fiquei convencida. Tenho uma filha de 6 anos e de uma primeira reunião, onde fartou-se de interromper e de sair do seu lugar, para a nossa última reunião de há dois dias atrás, revejo-lhe cada vez mais competência para encontrar soluções; mais responsabilidade e determinação a cumprir com calendários; mais confiante e disposta a partilhar as suas dúvidas e desafios, e acima de tudo, altamente motivada para estar em família.

O maior ganho está em ser uma prática que fortalece as relações familiares já que resulta a longo prazo e permite-nos partilhar intimidade, experiências e muitos bons momentos.

Sinto-me bem. Posso contar com todos. Os meus olhos brilham.

Jenny da Silva

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