Ao longo dos últimos meses, ao discutirmos a causa do nosso Projeto - Disciplina Positiva: Educação não punitiva. - muitas pessoas admitem, com
maior ou menor constrangimento, que batem nos seus filhos como forma correta de
disciplina-los, e assumem, sem grandes problemas, que continuarão a fazê-lo.
Apesar da lei de Violência Doméstica (Código Penal –
Art.152º), em vigência desde 2007, que condena este tipo de conduta transgressiva, esta prática é vista nas ruas como uma banalidade, por estar culturalmente enraizada na sociedade portuguesa, mesmo sem estarmos cientes disso.
Queremos dizer que, como população pacífica que mostramos
ser, é de grande modo incongruente que não exista a consciência que este tipo de conjunturas acima descritas se referem a situações de maus-tratos infantis. Ainda mais contraditório é o facto das famílias concordarem plenamente com a proibição do uso da violência nas escolas, terem nestas instituições, o exemplo de se conseguir educar sem o recurso à punição e ainda assim, aceitarem que esta última exista no seu próprio lar.
Assim, em jeito de conselho e sem intenção de ferir suscetibilidades, gostaríamos de sugerir uma pequena reflexão e introspeção, em formato de questionário, que nos poderá ajudar a reconhecer o estilo parental autoritário e iniciar a adoção do estilo parental democrático, à semelhança dos alicerces da nossa
sociedade:
- Como reage com as crianças? Costuma perder a paciência facilmente?
- Em pequeno, foi educado por castigos físicos?
- Transpor os limites é razão suficiente para dar uma palmada?
- Repete-lhe tantas vezes o que não deve fazer, e a criança parece que nunca aprende?
- Se a criança bater num colega, acha bem?
- Se a criança lhe bater de volta? Agrada-lhe?
- Gosta de se sentir com medo, com raiva ou humilhado?
- Quando a criança crescer, vai continuar a bater-lhe?
- Acha que estas coisas só se aprendem à força?
- E você? Será que já aprendeu tudo o que tinha para aprender?
O exemplo vem de
cima.
Agressividade gera agressividade...
e o melhor modelo de uma criança é o do adulto que a educa.
O mais comum é educarmos os
nossos, em comparação com a educação que nos foi dada e conforme a perceção que
temos de nós como adultos, pior ou melhor sucedidos. Mas isso não
invalida que não se evolua positivamente, mesmo que achemos que tenha corrido
bem connosco.
No dia a dia, encontramos de tudo:
- Desde a criança que arranca a bola a um colega e segue até uma parede onde possa jogar individualmente, e quando olhamos para os seus adultos mais próximos, nos deparamos com pessoas absortas no seu alter-ego, que não cedem mais do que as tarefas indispensáveis para o seu cumprimento parental, falhando crucialmente no essencial, a sua presença moral;
- Desde a criança que arranca a bola a um colega e segue até uma parede onde possa jogar individualmente, e quando olhamos para os seus adultos mais próximos, nos deparamos com pessoas absortas no seu alter-ego, que não cedem mais do que as tarefas indispensáveis para o seu cumprimento parental, falhando crucialmente no essencial, a sua presença moral;
- Desde ao adulto muito bem disposto e descontraído, que não
se opõe a nada que a criança faça, porque ela é mesmo assim e não importa que empurre
as pessoas pelo caminho ou mexa em tudo o que possa deitar a mão… fazendo com que a criança confunda a
liberdade genuína e responsável, com a volatilidade de objetivos supérfluos;
- Até à criança que grita constantemente e joga tudo o que
encontra à revelia, e tem ao seu lado um adulto que lhe traz pelo punho, joga-a na
cadeira e grita: “- Quantas vezes já te disse para te sentares?”.
Quem já tenha assistido a este tipo de situações, consegue
evidentemente traçar uma causa efeito e perceber que o maior erro de todos, é o de sermos
nós não estarmos a servir de bom exemplo. Ora, tomar consciência desta condição é
o maior passo para a mudança, tudo o resto é motivado pelo vínculo sentimental
à criança.
Bater desvaloriza o
adulto.
Suponhamos que voltávamos ao sistema feudal e que passávamos
a ser a mão-de-obra escrava de um qualquer senhorio...
Até mesmo numa altura em que pouco se sabia sobre liberdade e em que o acesso à informação era extremamente restrito, qualquer pessoa que estivesse numa posição suprimida se sentiria das duas uma, resignada ou revoltada, e em ambos os casos, inexistente.
Até mesmo numa altura em que pouco se sabia sobre liberdade e em que o acesso à informação era extremamente restrito, qualquer pessoa que estivesse numa posição suprimida se sentiria das duas uma, resignada ou revoltada, e em ambos os casos, inexistente.
Apesar do cenário descrito ser extremista aos nossos olhos, a
verdade é que aconteceu. E a violência de um ser, suprimido por outro, pelo sentido de
propriedade, é análoga ao do educador que restringe a criança à sua
impotência e menoridade.
De facto, também é verdade que, à medida que fomos avançando no tempo, nos tornámos cada vez menos agressivos.
De facto, também é verdade que, à medida que fomos avançando no tempo, nos tornámos cada vez menos agressivos.
Há simplesmente uma geração atrás, bater numa criança com um
cinto ou com uma haste de vime era socialmente aceite. Hoje, causa impressão a muita gente, até mesmo às pessoas
que recorrem às palmadas.
Em todo o caso, a tendência é a emancipação acontecer mais cedo ou mais tarde, ou seja, os mesmos direitos humanos auferidos aos adultos, serem igualmente afetos à criança.
Ao ensinarmos as nossas crianças com base no abuso de poder ou de forma indigna, de nada servirão as nossas palavras quando as quisermos afastar de estados abismais.
Este facto espelha-se mais frequentemente na adolescência, com a dita “idade
da parva”, já que até à data, além de não termos criado laços de confiança e
apoio suficientemente fortes para ultrapassar esta fase de crescimento; lhes
ensinamos a não cometer erros por vias punitivas e constantemente nos esquecemos de lhes
explicar os percursos mais corretos. Assim, quando se veem livres de repressões, estão mais
focados na experimentação desses mesmos erros como prova de revolta ou desafio,
do que orientados as suas ambições reais.
Se, ao invés, dermos desde cedo a liberdade para a criança de
fazer certas escolhas sobre a sua vida pessoal, sem as sobre proteger das suas
consequências e sobretudo sem as abandonar em momento algum, estaremos a ser
melhores educadores, já que poderemos caminhar lado a lado, sem rebeliões e com
uma base no respeito mútuo, em todo o processo de crescimento e além deste.
Bater desvaloriza a
criança.
Seja uma palmadinha no rabo, seja uns abanões ou
sacudidelas, seja um puxão de orelhas ou até mesmo umas inofensivas palmadinhas
nas mãos, nenhuma destas formas é aceitável como força disciplinante. Todas elas,
para além de causarem dor física, mesmo que momentânea, são humilhantes. Pior,
nenhuma ensina coisa alguma senão a que, está bem agir agressivamente desde que
seja para alcançar determinado objetivo, ou a de a criança não voltar a fazer
o mesmo erro na presença da pessoa agressora sobre o mote de medo, salientamos,
de medo e nunca de respeito.
Em todos os casos, e mesmo existindo posteriormente uma explicação ao
sucedido, a criança tem sérias dificuldades em absorver o
seu conteúdo, uma vez que está mais concentrada na sua própria mágoa, que na
avaliação do erro.
Praticamente, a criança está a expor a sua tristeza através
do choro e encontra-se ainda demasiado emocionada para entender o que quer que
seja. Quando já calma, normalmente, corre para os nossos braços à procura de auxílio
e de aceitação. Aqui, a maioria dos educadores tende a reprimir a criança, a metralhar-lhe
com o que não se faz, novamente evidenciando o erro e não a sua retificação e
a criança tem agora no seu foco, a sua reintegração ‘aos olhos’ do educador e
não, mais uma vez, a aprendizagem do erro.
Já ouvimos até alguns educadores dizer, num misto de
ingenuidade e crueldade, que estão a enrijecer as suas crianças para o futuro
que lhes espera. No fundo, apenas as ensinam a acreditar que não têm valor nem
poder sobre as suas próprias vidas, incutindo-lhe o medo pelas coisas, o que é devastador.
Bater traz más memórias. A agressão abusiva tem efeitos a
longo prazo.
O valor de uma criança disciplinada está na sua autonomia,
na sua autoconfiança, no seu poder em saber decidir por si, com sensatez.
- Se ao errar, se possível longe da mira
social e só depois de calma, perguntarmos à criança o porquê de tal acontecimento;
- Se lhe perguntarmos se sabe como deve proceder se acontecer
uma próxima vez e lhe dermos um voto de confiança de que saberá agir bem
futuramente;
- Se lhe mostrarmos com firmeza e com justiça, mas sem maldade, que todos os
erros têm consequências naturais, diretas, mais ou menos graves conforme o
relevo do erro;
Não estaremos a usar violência e estaremos verdadeiramente a
mostrar-lhes como a vida poderá ser lá fora, pelo menos, no melhor dos casos.
Então, porquê sermos nós, a quem as crianças tanto admiram, os
primeiros promotores da violência nas suas vidas? Não as deveríamos poupar? Que
razão existe para punir uma criança?
É sabido que a Humanidade está cada vez mais pacífica. E
esta mudança deve-se pelo nosso desenvolvimento intelectual. Quanto mais lúcido
o Homem for, menos violento será.
Por isso, por si e pelo bem das futuras gerações,
Seja inteligente... e não bata!
Jenny da Silva
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